se meu conselho valer, eu que andei por esse caminho ainda tão nova, você que me lê, que sabe de alguém que esteja passando por situação semelhante, faça o que não fizeram por mim.
não divida a família.
não diga para a mãe ser forte para os filhos, e para os filhos serem fortes para a mãe. não ensine que as dores devem ser vividas individualmente porque o outro não é forte para segurar a dor dele e a sua também.
demorei muito para aprender sozinha o óbvio: ninguém tem que ser forte num caso de doença. as pessoas precisam se unir, como numa nevasca, para que o calor de um aqueça o outro, numa bolinha de gente se defendendo do frio.
respeite a maneira que a pessoa vive esse momento. não adianta nada dizer "reaja! grite! bote para fora a sua dor!" se a pessoa não está pronta para entrar em contato com essa dor. eu estou vivendo a dor da perda do meu pai aqui, em palavras, mais de dez anos depois do derrame que o deixou cinco anos em coma.
seja gentil. deixe saber que você está por perto. para aquelas conversas sem palavras. para ouvir um disco e dançar. para levar pro cinema, uma comédia boboca, para dar risada. essa é a força necessária para enfrentar doenças e tragédias. não esconder o problema, não botar um holofote nele. sim, o problema existe, mas a vida continua, e isso é o estranho da vida. ela continua. a gente continua. e até quem morre continua na gente.
a questão é como a gente vai continuar.
eu não perdi a esperança, o amor pela vida, o amor por meu pai, a mania de falar besteira, o carinho pelas crianças, um certo lirismo. mas perdi muito da minha adolescência, perdi o sossego quando o telefone toca mais tarde na noite (primeiro pensamento: é desgraça?), ganhei uma angústia ao ver ambulâncias e total incapacidade de assistir filmes com pessoas doentes.
esse foi meu preço.
não sei qual será o dos outros.
mas você que está me lendo, não desista.
viva a sua vida, as suas dores, suas alegrias, do seu jeito. e saiba que é do ser humano sobreviver.