26.11.10

de tando lembrar e sonhar e pensar e reler cada momento, tenho medo de ter criado um novo pai na minha cabeça. quem ele era, na vida real? sobra tão pouco para eu me agarrar e dizer "ele era assim, com certeza."

eu já esqueci, eu já recriei, eu misturei sonho, realidade e saudade. o som de sua voz, como era? se eu ouvir, eu reconheço? como era mesmo que ele me pedia café? o cheiro da sua roupa, sua altura? as coisas se perderam como os pares das abotoaduras, dos pés de meia.

um dia eu vou olhar para trás e constatar, abismada, que eu criei meu pai.

20.11.10

ontem o pai de uma amiga morreu.

seu sebastião estava muito velhinho. muito mesmo, mais de 90 anos. foi pracinha na segunda guerra, imaginem.

e ontem, ele morreu. ao falar com ela, ela disse que esperava, que ele estava doente, mas que não sabia que ia doer tanto. e eu disse a ela que ele foi um homem de bem, estava num lugar bonito no céu, que ele não havia sofrido. e que sim, ia doer, ia doer muito, muito, até o dia em que a dor viraria saudade e ia passar a doer diferente.