26.2.09

lembrei de mais uma do meu pai.

a família da minha mãe morava em outro estado. então, umas duas, três vezes no ano, eu e ela íamos visitar minha avó. Sim, eu ia junto, para minha mãe não viajar sozinha. meu pai ficava sozinho em casa, o rei no seu castelo.
Uma vez, ao voltarmos de uma viagem - eu tinha 11, 12 anos? - encontramos toda a louça da casa suja. toda. a. louça. de. casa. suja.
inclusive a louça bonita do casamento dos meus pais, que servia 12 pessoas.
por todo canto, copos e xícaras com um dedo de café velho no fundo e umas bitucas de cigarro. e a gente tava com um cachorrinho novo em casa, então o chão da casa tava forrado de jornais com xixis.

e meu pai ainda fez a delicadeza de mandar a empregada embora.

minha mãe, santa criatura, foi lavar os pratos - pratos que eu fui a encarregada de juntar, claro. e de limpar a sujeira do cachorro.

e meu pai, o rei no seu castelo, não disse um pio e não ouviu uma reclamação. pelo menos, não na minha frente.

19.2.09

ontem a minha irmã mais velha leu para mim a dedicatória de seu trabalho de conclusão de mestrado. ela o ofertou a nossos pais. e, enquanto ela falava de tão longe as palavras delicadas que encheriam papai de orgulho e encherão mamãe de lágrimas, eu pensei que os meus pais e os pais dela, apesar de serem rigorosamente as mesmas pessoas, são tão diferentes entre si quanto um retrato da pintura desse retrato.

o pai das minhas irmãs, o meu pai. ambos são uma única pessoa, da qual só conheço parte. e me dá uma sensação de arqueologia, de descobrir pedacinhos de uma civilização perdida. eu tenho timidez e respeito pela dor alheia, por isso ainda não liguei para minha tia e pedi para que ela contasse histórias da adolescência dos dois: ela e papai eram os filhos mais novos da minha avó. eu vi uma foto deles prontos para ir para a escola, um rapazinho, uma mocinha, muito sérios na frente de casa, no jardim, eu acho.

mas ela o amou muito, e eu tenho tanto medo que isso, ao invés de trazer a saudade boa que eu sinto, faça com que ela sofra. minha tia. eu tenho o mesmo nome dela, o mesmo nome da minha avó.

3.2.09

eu tenho pensado muito em como seria a vida da minha família, a minha vida, se meu pai estivesse vivo e com saúde.
não consigo chegar a nenhuma conclusão. o pensamento se atrapalha, se embota, o coração dói de saudade, e eu não consigo imaginar mais nada.

só sei que sinto muito a sua falta, pai